No seu dia, a Bandeira não tremulou: ela se encolheu de tanta vergonha
Ao que parece, o pavilhão nacional viveu um de seus piores momentos na História. Nunca antes na história deste país o dia da Bandeira fora ofuscado pela prisão daqueles que, constitucionalmente, a defendem (ou deveriam defender). Não bastasse o solavanco das prisões, a semana ainda guardou outro desgaste: o indiciamento de vários oficiais superiores, sendo não poucos generais.
Não estou aqui me propondo a analisar os processos defectivos e falhos na formação militar que possibilitam que oficiais da mais alta patente se dobrem a um desqualificado capitão. Nem tampouco apresentar as falhas formativas na caserna que seguem a inspirar, e não coibir, as aspirações golpistas, como se fosse um gene passado de geração em geração. O que me interessa é estender a bandeira para mostrar quem estava enrolada nela desde a última terça. Particularmente meu foco são os evangélicos.
Interessa iluminar e discutir porque as denominações evangélicas que, a reboque da ANAJURE, o que já se constitui um problema devido sua inexpressividade, emitiram notas de condenação a tudo e todos que questionavam o Governo Bolsonaro, não se pronunciaram desta vez. Onde foi parar aquele açodamento todo? Exemplo maior disso foi no caso do pedido de Impeachment "dos religiosos". Todavia, conforme vai sendo destampado o caldeirão do governo derrotado nas urnas, a falta de pronunciamento persiste.
Será, como lembrou um amigo meu, que tais lideranças aguardavam a concretização do plano golpista com manchetes prontas para seus periódicos denominacionais, agradecendo a Deus pela resposta às orações? Sim, a cegueira ideológica imposta pelo fascismo pode chegar ao cúmulo de tornar Deus um abonador de assassinos e assassinatos. Para os que acham um exagero, lembro que já aconteceu uma vez, no período da ditadura civil-militar.
Denominações que forneceram quadros para o Governo Bolsonaro precisam sair de trás do Pavilhão nacional e se indignarem publicamente contra o que aconteceu. Urge o deslindamento e o reconhecimento de que erraram ao apoiar a extrema-direita. Se não possuem a força moral, tampouco o cristianismo suficiente para pedir perdão, pelo menos que se desenrolem da bandeira na qual se esconderam, e condenem com veemência a conspiração golpista. Penso que não seria difícil para grupos que incorporaram ao seu modus faziendi a confecção de Notas de Repúdio, emitir mais um comunicado, pronunciamento.
Lembro a vocês que textos como este servirão à História para testificar que não houve isenção. Boa parte da liderança evangélica escolheu um lado. Infelizmente (para vocês), a cada dia que passa ele se mostra pior.
*Os textos publicados pelo Observatório Evangélico trazem a opinião e análise dos autores e não refletem, necessariamente, a visão dos demais curadores ou da equipe do site.
Pr. Dr. Sérgio Ricardo Gonçalves Dusilek é Mestre e Doutor em Ciência da Religião (UFJF/MG); Pesquisador do Núcleo de Estudos e Pesquisa em Filosofia da Religião, da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF/MG); Pesquisador em Estágio de Pós-Doutorado pela UEMS (Bolsista CAPES); Pastor na Igreja Batista Marapendi (RJ/RJ); Professor do Seminário Teológico Batista Carioca. Autor de Bíblia e Modernidade: A contribuição de Erich Auerbach para sua recepção e Co-organizador de: Fundamentalismo Religioso Cristão: Olhares transdisciplinares; O Oásis e o Deserto: Uma reflexão sobre a História, Identidade e os Princípios Batistas; e A Noiva sob o Véu: Novos Olhares sobre a participação dos evangélicos nas eleições de 2022.