Quem é o pastor?

Quem é o pastor?

Por vezes, ao olhar as redes sociais, tenho a impressão de que a figura pastoral transita em dois polos: o primeiro, que a trata como o pior dos seres humanos, como alguém invariavelmente perverso, trambiqueiro, aproveitador e criminoso; o segundo, que a percebe como um tipo de figura angelical, acima de qualquer suspeita. Duas leituras fragorosamente equivocadas. Então, quem é o pastor?

O pastor é, ou pelo menos deveria ser, alguém que entendendo e atendendo um chamamento divino, devota sua vida a Deus mediante o serviço às pessoas. Ele aconselha, visita, celebra casamentos, realiza funerais, prepara sermões, prega na igreja, nas casas, eventos. Liga nos aniversários, socorre nas crises conjugais, planeja, lidera. É tanta demanda que não raras vezes o pastor acaba casando com a igreja e perdendo seu casamento.

Há os casos de pastores que não têm sua dedicação exclusiva para a igreja e que, por esta razão, precisam conciliar sua agenda eclesiástica e familiar com a do trabalho. Vivem em uma espiral.

O pastor é um ser humano como qualquer outro. Isto equivale a dizer que ele passa pelos mesmos problemas que são suscetíveis à experiência humana. Ele enfrenta enfermidade na família, falta de dinheiro na virada do mês... Pasme: a grande maioria dos pastores tem vida simples, destoando do padrão nababesco dos barões da fé. Pastor também comete pecado, também precisa do perdão de Deus como qualquer outra pessoa.

Acho interessante esta conotação de que a única ocupação que não pode ter remuneração é a do sacerdote religioso. Professor pode ter salário; bancário pode ter salário; médico pode cobrar pela consulta; mas o pastor tem que viver, na cabeça de muitos, com o Maná que cai do céu. Afinal, ele não trabalha... Uma das muitas fake news cuja realidade multifacetada da prática pastoral desmente.

Pastores são líderes que influenciam pelo exemplo. A Bíblia fala da figura pastoral como "paradeigma" (da onde vem o termo paradigma). Eventualmente, na sua humanidade, na sua finitude, um pastor pode falhar, errar. Nessas horas é preciso, especialmente para quem teve uma vida reta, agir com misericórdia.

Entretanto, é possível encontrar entre os pastores aqueles que não o são. Há lobos, predadores travestidos de pastores. Não raras vezes transitam da imoralidade para o crime. Tais pessoas, ao cometerem crimes, precisam ser denunciadas ao poder público. Quanto aos predadores, porém não criminosos, estes precisam ser retirados da liderança.

Não escrevo na expectativa que você passe a valorizar o trabalho pastoral. Espero tão somente que você deixe de desvalorizar pastores que honram sua vocação, por conta do péssimo testemunho de alguns poucos poucos predadores e barões da fé.

*Os textos publicados pelo Observatório Evangélico trazem a opinião e análise dos autores e não refletem, necessariamente, a visão dos demais curadores ou da equipe do site.


Pr. Dr. Sérgio Ricardo Gonçalves Dusilek é Mestre e Doutor em Ciência da Religião (UFJF/MG); Pesquisador do Núcleo de Estudos e Pesquisa em Filosofia da Religião, da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF/MG); Pesquisador em Estágio de Pós-Doutorado pela UEMS (Bolsista CAPES); Pastor na Igreja Batista Marapendi (RJ/RJ); Professor do Seminário Teológico Batista Carioca. Autor de Bíblia e Modernidade: A contribuição de Erich Auerbach para sua recepção e co-organizador de: Fundamentalismo Religioso Cristão: Olhares transdisciplinares; O Oásis e o Deserto: Uma reflexão sobre a História, Identidade e os Princípios Batistas; e A Noiva sob o Véu: Novos Olhares sobre a participação dos evangélicos nas eleições de 2022.