Promessas e Realidades: questões sobre a relação entre Política e o “Mundo Evangélico Brasileiro”
Em uma recente entrevista ao Jornal Folha de São Paulo, publicada no dia 20/04/2024, o renomado pesquisador e presidente do Instituto Locomotivo, Renato Meirelles, disse que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva precisaria adotar uma abordagem baseada na teologia da prosperidade para conquistar o apoio da baixa renda. No entanto, é preciso questionar os motivos que o levaram a fazer essa afirmação. Por quê, teologia da prosperidade?
A teologia da prosperidade, basicamente, aponta para dois caminhos, a saber, para o cominho de uma teologia sacrificialista na qual o indivíduo sacrifica “tudo” e o caminho da prosperidade pelas trocas simbólicas, pelas quais você “barganha” com o divino. Esses elementos se assemelham às igrejas “universais, mundiais e internacionais”, uma vez que, a partir de suas teologias, dominam e atingem um nicho específico de consumo que, ao mesmo tempo que consomem os discursos, não aderem a essas instituições como membros efetivos. Além disso, é simples realizar uma pesquisa rápida para constatar que as organizações que trabalham com a teologia da prosperidade não estão localizadas em áreas periféricas, mas sim em locais de grande circulação social, como avenidas, pontos de ônibus e grandes centros urbanos. Assim sendo, contrariamente à sugestão de Meirelles, diversos especialistas enfatizam que a chave para reconquistar o apoio da maioria da população não está em promessas ilusórias de riqueza imediata, mas sim em políticas sociais consistentes e duradouras que visam aprimorar as condições de vida dos mais necessitados.
Talvez uma abordagem eficaz para Lula seja apresentar uma perspectiva de futuro sólida, fundamentada em políticas que amenizem as diferenças socioeconômicas amplamente. Em vez de apenas apelar para uma mensagem de prosperidade individual/ e/ou “neopentecostalizada”, Lula pode criar um plano que aponte para questões como desemprego, acesso à saúde, educação de qualidade e distribuição de renda.
Além disso, é crucial reconhecer que a igreja evangélica não é monolítica em suas crenças políticas e sociais.Apesar da retórica da teologia da prosperidade e outras teologias, muitos evangélicos são atraídos por princípios como justiça social e solidariedade, por exemplo. Nesse aspecto, o presidente pode ter um grande apoio entre os evangélicos ao destacar o seu compromisso com políticas que promovam a igualdade e o bem-estar coletivo. Assim, a sugestão de que Lula deve seguir a teologia da prosperidade para conquistar a renda baixa é simplista e limitada.
Em relação à ascensão política do ex-presidente Jair Bolsonaro entre a baixa renda, especialmente nas igrejas evangélicas de base, seu crescimento se deu pela aproximação de pautas conservadoras e não podemos ignorar esse detalhe que visava um tipo de “Brasil Evangélico”. Isso se deve às alianças políticas de Bolsonaro e sua inegável influência entre lideranças religiosas. Neste cenário, a habilidade dos líderes religiosos, especialmente os pastores evangélicos, de influenciar o voto é um fator relevante a ser considerado. A confiança depositada nesses líderes e a proximidade estabelecida com suas igrejas criam um ambiente propício para a disseminação de ideias e diretrizes políticas. A retórica moral e os valores conservadores que esses líderes costumam propagar entre os fiéis, moldando suas perspectivas e decisões eleitorais.
A estratégia política adotada por Lula e o PT para recuperar a pobreza, especialmente entre os evangélicos, enfrenta obstáculos significativos. Não basta apenas apresentar políticas sociais progressistas; é preciso também estabelecer uma relação de confiança e credibilidade com as comunidades religiosas, desafiando as narrativas tradicionais e oferecendo uma perspectiva de futuro baseada na justiça social e na inclusão. Ao mesmo tempo, é importante reconhecer que a influência das igrejas evangélicas na política brasileira não deve ser vista de forma homogênea. Há vozes divergentes dentro dessas comunidades religiosas, que questionam o alinhamento político estreito com algumas lideranças e buscam uma abordagem mais crítica e reflexiva em relação às questões políticas.
Dessa forma, para recuperar a confiança e o apoio da população de baixa renda e dos eleitores evangélicos, é crucial que os líderes políticos como Lula não apenas atentem para questões econômicas concretas, mas também compreendam e respondam às diversas dimensões que influenciam as escolhas políticas desses grupos. Uma abordagem atenta, que considere não apenas as necessidades materiais, mas também as aspirações sociais, culturais e religiosas, será crucial para estabelecer pontes e reforçar os laços de confiança com a população brasileira.
*Os textos publicados pelo Observatório Evangélico trazem a opinião e análise dos autores e não refletem, necessariamente, a visão dos demais curadores ou da equipe do site.
Lucas Medrado é doutorando em Letras pela Universidade de São Paulo (USP). Mestre em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo. Especialista em História e Teologia do Protestantismo no Brasil pela Faculdade Teológica Batista de São Paulo. Especialista em Psicopedagogia Clínica e Institucional pela Universidade Santo Amaro. Graduado em Letras Português/Inglês pelo Centro Universitário Estácio Radial de São Paulo. Membro da Rede Latino-americana de Estudos Pentecostais (RELEP). É autor do livro Cristianismo e Criminalidade (Fonte Editorial). Pastor auxiliar na Caminho da Cruz.