Fake news desviam missão das igrejas nas redes sociais
A intimidade que hoje presenciamos entre os evangélicos e as redes sociais exprime vividamente uma vivência forte nas tradições protestantes, que vem se estendendo por séculos e que pode ser resumida pelo princípio da koinonia, termo de origem grega que significa comunhão e derivada da palavra oikos ou seja, casa, ideia cara ao cristianismo. A importância concedida à reunião da comunidade, à reunião de todos debaixo do mesmo teto, frequentando a mesma casa, partilhando as mesmas experiências de fé, se intensificou com o advento das redes sociais. Verificamos a extensão da koinonia para o espaço virtual.
O papel que esse espaço cumpre na intensificação da vivência de comunhão entre os fiéis pode explicar porque os evangélicos parecem ser mais ativos no uso das redes sociais do que outros grupos religiosos, em especial nos grupos de WhatsApp criados pelas igrejas. Estas têm aproveitado essa ferramenta para compartilhar informações e avisos, para edificar, congregar e reunir.
Para os fiéis, esses não são como os grupos familiares que também frequentam. A função dos grupos criados por iniciativa das igrejas é reunir e agregar os religiosos, unir ainda mais a comunidade da igreja. Para além dos grupos criados para reunir o conjunto dos fiéis, as igrejas têm realizado essa missão incentivando a participação dos evangélicos nos grupos direcionados a perfis específicos, jovens, mulheres, homens. Atualmente, muitas igrejas alimentam grupos temáticos dentro desses e de outros recortes.
Além disso, tenho notado que necessidades surgidas no interior da comunidade também têm sido atendidas pelas igrejas, que criam grupos de WhatsApp para tanto. Por exemplo, quando acontece de alguma jovem que frequenta a igreja engravidar, é comum a igreja criar um grupo de WhatsApp especialmente para a organização do chá de bebê. Ou então para ajudar uma família na construção de uma casa ou na realização de algum reparo. A presença ativa dos evangélicos nas redes sociais, e em especial no WhatsApp, parece se explicar por essa maneira pela qual as igrejas vem buscando fortalecer os vínculos da comunidade. Entretanto, há obstáculos graves à missão das igrejas.
A iniciativa de se ampliar a presença do templo para o espaço virtual facilita a atuação de evangélicos de direita comprometidos com a reeleição do presidente. Como ocorre de muitos apoiadores do presidente serem evangélicos, os grupos de WhatsApp têm se tornado um meio para que esses sujeitos expressem seus posicionamentos. Muitas vezes essas pessoas não têm a oportunidade de subir ao púlpito, de falar com todos os fiéis, mas como são membros da Igreja, elas se valem do acesso aos grupos de WhatsApp para tomar a palavra, compartilhando informações favoráveis ao presidente, ou mesmo fake news, o que exige dos pastores não alinhados com a direita um esforço tremendo para convencer a comunidade da falsidade de determinada mensagem veiculada. Da minha parte, confesso que eu mesmo já abandonei um grupo quando percebi que seus membros estavam compartilhando notícias falsas.
Para retomarmos a ideia inicial deste texto. Os evangélicos e os cristãos, de modo geral, vêm ao longo dos séculos desenvolvendo e valorizando um vínculo baseado pelo princípio da koinonia, que significa comunhão — a partilha, as experiências, as dúvidas, anseios, os pedidos de orações, as dificuldades, as vitórias, os fracassos. As redes sociais acentuaram ainda mais essa característica dos cristãos e dos evangélicos, estes voltam seus esforços para a vivência da igreja neotestamentária, fortalecendo a comunhão pela ocupação da esfera virtual. Se essa tendência ampliar, aos pastores comprometidos com a defesa da democracia será exigido o empenho para realçar o propósito da imersão das igrejas no espaço virtual, o cultivo da comunhão em detrimento de más intenções movidas por interesses partidários.