Argentina revela articulação internacional evangélica
Nesse domingo, aconteceu o segundo turno das eleições presidenciais na Argentina, as quais elegeram o economista ultra liberal Javier Milei como futuro novo presidente do país. Para além das discussões a respeito dos resultados do pleito e das perspectivas para o próximo período argentino, vale a pena nos atentarmos para algo anterior que a campanha revelou: o apoio de setores evangélicos dentro e fora da argentina a Milei mostra uma articulação internacional de religiosos por candidatos de ultradireita.
A Argentina, tradicionalmente uma nação de maioria católica, passa também por uma mudança na sua configuração religiosa. De acordo com a Segunda Pesquisa Nacional sobre Crenças e Atitudes Religiosas, o número de argentinos que se identificam como cristãos evangélicos aumentou de 9% em 2008 para 15,3% em 2019. Paralelamente, a parcela da população que se identifica com o Catolicismo caiu de 76,5% para 62,5% no mesmo período. Dado a tendência demonstrada, podemos considerar que, em 2023, o número de evangélicos na argentina seja ainda maior.
Apesar de as pesquisas eleitorais não detalharem o perfil religioso do eleitorado e a relação específica entre pertencimento religioso e voto, existem indícios de que essa população evangélica argentina pode ter votado em maior número em Javier Milei, quando comparada com outros grupos religiosos. Enquanto líderes evangélicos negaram um apoio institucional formal à candidatura de Milei, há evidências de que, na prática, esse apoio tenha existido. Pastores mencionaram que, embora não houvesse um apoio organizado, em algumas igrejas se falava de votar em Milei, especialmente por suas políticas contra a despenalização do aborto e a educação sexual nas escolas. Esses depoimentos sugerem que foi percebido uma afinidade entre os valores defendidos por Milei e as crenças de parte dos fiéis evangélicos.
O apoio evangélico a Milei acontece apesar de ele não se encaixar no molde típico de um candidato religioso. Milei, conhecido por sua linguagem grosseira e falta de frequência a eventos religiosos, até afirma se comunicar mediunicamente com seu cachorro falecido, uma prática claramente rejeitada pela teologia evangélica. Essa incongruência sugere que o apoio dos evangélicos a Milei não se baseia em afinidades religiosas, mas sim em um forte rechaço à esquerda.
A eleição de Milei foi amplamente celebrada nas redes sociais por figuras evangélicas proeminentes do Brasil e dos Estados Unidos, evidenciando tal articulação internacional de parte desse segmento religioso. Essa comemoração transnacional revela um movimento evangélico mundial atuando na política, sendo guiado menos por questões locais ou princípios teológicos, e mais por um posicionamento político anti-esquerda e alinhado à ultra-direita.
Vale dizer que, com a situação econômica que a Argentina enfrenta, é claro que a economia, e não a religião, foi o motor principal do voto em Milei. No entanto, olhar para a questão religiosa é importante para revelar outros fatores para o voto em Milei, bem como para mostrar tendências para pleitos futuros.