Apoio ao ensino domiciliar faz evangélicos ganharem votos
Alguns grupos evangélicos conservadores, de modo recorrente, entram em polêmica quando o assunto é quem deve e o que deve ensinar aos filhos. Por vezes, empresas são objeto de cancelamento na internet, professores são denunciados ao se aventar que estão ensinando às crianças valores julgados anticristãos. Por essas e outras razões, esses grupos veem no ensino domiciliar, no homeschooling, uma espécie de mosteiro privado livre da doutrinação do que chamam de “marxismo cultural”, “ideologia de gênero” ou de ensinos antibíblicos, motivando, por sua vez, o apoio de muitos políticos ao Projeto de Lei 3179/2012 que regulamenta tal prática.
Sim, o homeschooling não interessa apenas a religiosos, mas eles são os mais engajados nessa pauta. Por quê? Algumas pessoas interessadas na prática responderam à minha pergunta privada sobre a razão de serem evangélicas e se interessarem pelo ensino domiciliar. Uma delas expôs as seguintes razões: “ensinar os princípios bíblicos aos filhos, conectados a aprendizagem das matérias em geral, evitar a influência marxista, evitar o ensino distorcido e antibíblico. Também é por conta da má qualidade da educação e da possibilidade de aproximar pais e filhos”. Vê-se, portanto, que a principal motivação se conecta aos princípios religiosos, não obstante existirem outras motivações.
Ora, como disse em outro texto, a lógica da família estrutura o discurso e as práticas de evangélicos conservadores, e isso faz com que muitos vejam seu ideal de família ameaçado por conteúdos que tratam das novas famílias ou da diversidade de gênero na escola. Outra resposta que recebi de uma mãe evangélica, além de razões semelhantes às apresentadas acima, afirma que o ambiente escolar traz uma desvalorização para a família. Ela argumentou que “há um bordão que todo professor/coordenador repete que ‘família e escola precisam andar juntos’, mas o que acontece é que, na primeira oportunidade que aparece, os pais são tratados como pessoas que não estudaram e não sabem de nada”. Há alguns anos, um metalúrgico, ao explicar a razão de ele e a esposa adotarem o homeschooling, disse: "Somos evangélicos e seguimos princípios bíblicos contrários ao que se ensina na escola, como o homossexualismo”.
E o que dizem os professores evangélicos? Em conversa informal que tive sobre o tema, muitos deles são contrários ao projeto de lei que regulamenta o ensino domiciliar, mas alguns outros acham que é justo que as famílias tenham essa liberdade de ensino, no entanto esboçam preocupação, sobretudo, com a formação dos pais para exercerem o ofício, bem como com o problema da socialização com outras crianças e com o fato de as famílias pobres não terem condições de praticar a modalidade, de modo que o homeschooling se torna uma modalidade elitista.
Mas se na prática interessa a poucos, por exemplo, nos USA apenas 3% das famílias praticam a modalidade, por que muitos políticos evangélicos brasileiros apoiam o Projeto de Lei? Penso que, para além das crenças individuais de alguns, a pauta interessa a muitos políticos evangélicos porque ajuda na construção de sua imagem junto ao eleitor conservador, de modo que o político se apresenta como defensor da família tradicional, contrário ao que chamam de “ideologia de gênero”, “marxismo cultural”, politicamente correto, colocando-se como defensor de uma suposta liberdade de ensino.
Como se pode facilmente observar, o tema é pauta para antigos e novos políticos evangélicos, como por exemplo a pré-candidata a deputada federal pelo Paraná, a psicóloga evangélica Marisa Lobo, a qual comenta sobre a aprovação do ensino domiciliar ao Gospel Mais: “é uma vitória para os brasileiros que lutam contra a doutrinação ideológica nas escolas”. E como qualquer outro político, os políticos evangélicos estão de olho nos temas que povoam o imaginário de seu eleitorado conservador, e o ensino domiciliar passa a ser um deles. Ora, como o discurso político não é menos que um jogo de imagens, e mesmo que o tema não beneficie a expressiva maioria evangélica, ele representa valores essenciais a esse público, e, claro, rende votos.